Adolescente com doença rara (Adrenoleucodistrofia) usa as aulas da Academia do Rock como tratamento pós-transplante de medula
A música tem uma importância significativa no nosso dia a dia. A pessoa pode não gostar de um determinado estilo musical, mas sempre terá uma canção que marcou algum momento da sua vida. A música, seja qual o estilo, é encontrada em todos os aspectos da sociedade: desde o tradicional rádio, trilhas sonoras, programas de TV e até em campanhas políticas.
Mas o mais importante é o poder que a música tem de afetar o nosso estado de espírito e emoções. Quando a música nos agrada, nosso corpo libera hormônios como a dopamina, que nos faz sentir bem e melhora o nosso humor. Além disso, a música pode ativar áreas do cérebro associadas a memória e à emoção, que pode ser particularmente útil para algumas síndromes e doenças.
A fonoaudióloga Maria Julia Pessoa Hoffmann conta que a música é uma grande diferencial e um aliado nas terapias. “O estilo musical que funciona é o que a pessoa gosta. Hoje, a terapia é toda em cima dos gostos do paciente. E o resultado é muito maior. Não adianta treinar retorno da deglutição com sardinha, se o paciente tem pavor de gosto de peixe. Trabalhamos com algo que de prazer e traga memórias boas”, enfatiza Maria Julia.
E o Rock também ajuda nos tratamentos. Exemplo disso é o aluno da Academia do Rock de Curitiba Eduardo Hobi Berbigier, 14 anos, acometido por ALD – Adrenoleucodistrofia, uma doença genética rara que afeta o metabolismo de ácidos graxos de cadeia muito longa e pode resultar em danos neurológicos progressivos, incluindo distúrbios na fala, audição e visão. “Eduardo teve o diagnóstico de ALD em setembro de 2017 e se submeteu a um transplante de medula óssea, ficando por vários meses internado no hospital e depois mais um ano e meio de recuperação, mesmo assim, desenvolveu algumas sequelas, como uma lesão no lobo frontal do cérebro ocasionando um déficit de atenção muito grande e um transtorno de ansiedade”, lembra o pai Eduardo de Abreu Berbigier.
“As aulas na Academia do Rock fazem parte do tratamento do Eduardo”, comenta o pai. Inicialmente o adolescente começou a praticar bateria e hoje faz também aulas de guitarra. “Meu filho mudou completamente. Acalmou a ansiedade, mudou a concentração, mudou o foco”, explica.
Hoje Eduardo consegue ficar mais sentado, focado, concentrado na leitura e na sala de aula. “Antes ele caminhava muito sem rumo. Hoje ele consegue se concentrar além de ter melhorado a coordenação motora”, salienta.
Além das aulas de música há também um acompanhamento terapêutico com uma série de atividades, mas segundo o pai, o Rock tem incentivado o Eduardo, inclusive com a melhora na autoestima, desenvolvendo um prazer que até então o Eduardo não possuía, devido ao trauma do transplante.
“De todas as atividades que o Eduardo faz a que ele mais gosta, sem dúvida alguma, são as aulas de música, tanto que já me pediu uma guitarra”, comenta o pai. “As aulas da academia do rock junto com o acompanhamento terapêutico foram e estão sendo determinantes na recuperação do pós-transplante do Eduardo, que hoje está plenamente recuperado da ADL ”, pontua.
Sabrina Faria, psicóloga que acompanha Eduardo nas aulas da Academia do Rock, comenta que na adolescência o contato com a música pode ser um aliado positivo não só no contexto social, mas também na construção e na consolidação da identidade através do fortalecimento de vínculos, promoção da autoestima, sentimentos de identificação e pertencimento nos grupos, confiança e segurança.
Desenvolve ainda habilidades cognitivas e comportamentais, elaboração de manejo em situações rotineiras, produz repertório comportamental, além de, ser capaz de influenciar positivamente no humor e estado emocional.
“No aspecto cognitivo, a prática musical proporciona acessar diferentes áreas do cérebro enquanto em atividade, promove a comunicação entre os dois hemisférios do cérebro, favorece acesso a maiores e mais redes neurais propiciando a plasticidade estrutural e funcional no cérebro, consequentemente influenciando no funcionamento cognitivo. Estimula positivamente regiões do cérebro responsável pelo planejamento, controle e execução de atividades motoras voluntárias, além de atuar na movimentação, equilíbrio e postura. Auxilia na formação de memórias, localização espacial, aprendizado e emoções, conectando as sensações, e emoções às memórias”, explica Sabrina
Sabrina ainda complementa que os estudos sugerem a existência de processos de neuroplasticidade como consequência da prática musical, esse processo oferece ao cérebro se adaptar frente a determinadas situações como traumas e lesões. “Antes visto como lazer, hobby ou uma atividade para quem já teria uma habilidade ou identificação, hoje a música pode ser considerada como uma opção atualizada, autêntica, dinâmica e positiva no tratamento de algumas doenças e reabilitação neurológica”, conclui.
Após o diagnóstico do Eduardo, Eduardo e Ticiane Berbigier criaram o Instituto Berbigier que acolhe e fornece apoio a pacientes acometidos por doenças raras e seus familiares, providenciando cestas básicas, produtos de higiene e outras necessidades. Além disso, o Instituto pretende facilitar o encaminhamento do paciente, ajudando famílias a agilizar o processo na busca do tratamento.
“Dentro do Instituto vamos incluir a música também como uma das ferramentas de tratamento para os raros. Acreditamos que, como nosso filho vem se desenvolvendo muito bem com as aulas de rock, a música é um excelente recurso no apoio de outras síndromes e doenças raras”, finaliza Eduardo de Abreu Berbigier.